Hoje, é impossível que o mundo dos negócios esteja desconectado da sociedade e isso inclui os desafios que ela enfrenta. Propósito tornou-se peça-chave para o sucesso de empresas nesse novo contexto da economia. Marcas são cada vez mais cobradas pelo público – mais engajado e conectado – para que seus modelos de negócio abordem problemas sociais a ajude a endereçar causas.  

Já é consenso que os padrões de compra serão cada vez mais pautados pela percepção que se tem do comportamento das empresas, seu posicionamento e outras questões de reputação. Mas, além do mercado consumidor, tal tendência é válida também entre os investidores: daqui para frente, ao buscar acessar capital, empresas devem estar atentas aos novos critérios vigentes no mercado.

Esse foi o insight trazido pelo recorte do Trust Barometer 2019, focando especificamente no público de investidores e analistas financeiros. Ao ouvir 500 profissionais da área, nos EUA, Alemanha, Canadá, Grã-Bretanha e Japão, trouxe uma leitura global do que mudou no segmento, com um retrato do investidor do futuro, que tende a ser muito mais ativista em seus aportes.

A edição especial do estudo constatou que 66% dos investidores consideram de suma importância uma visão de longo-prazo por parte das empresas, buscando identificar estratégias para garantir sua perenidade em um mundo de mudanças cada vez mais aceleradas. Além disso, questões de governança e cultura corporativa têm crescido dentro da fórmula de avaliação financeira. Enquanto o público geral já tende a esperar da iniciativa privada uma postura que ajude na resolução de problemas sociais – com 64% das pessoas afirmando que CEOs devem liderar a mudança – esse número é praticamente absoluto quando olhamos para o grupo de analistas financeiros – 98% deles acreditam que empresas de capital aberto devem urgentemente atuar frente à problemas sociais e lista como tópicos prioritários áreas como: cyber segurança, desigualdade salarial, diversidade no mercado de trabalho, segurança nacional e imigração.

A grande maioria (89%) afirma que tem incluído cada vez mais critérios sobre preservação ambiental, engajamento interno com o time de colaboradores e governança (do inglês ESG) ao fazerem análises de negócio e, dessa parcela, 63% dizem que a mudança ocorreu no último ano. É impressionante também o número de profissionais do mercado financeiro (87%) que concordam que suas firmas estariam dispostas a receber uma taxa de retorno menor, ao identificar uma preocupação sustentável duradoura nos candidatos ao investimento. É exigido também que o conselho administrativo, uma vez que personificam a própria empresa, se mostre aberto às demandas do público e esteja compromissado com causas.

Além disso, ficou evidente que corporações não controlam por completo sua própria narrativa, pois as fontes de informação buscadas por investidores incluem porta-vozes externos à empresa analisada. Dessa forma, a equipe de relações com investidores deve redobrar o cuidado na percepção de analistas e stakeholders terceiros, para garantir alto grau de coesão da imagem apresentada ao mercado e por ele percebida.

O estudo também notou que esses profissionais têm buscado cada vez mais informações em canais não tradicionais. Perfis institucionais e dos executivos em diferentes redes sociais passaram a ser rotina no monitoramento que o mercado financeiro realiza para apostar nas empresas de sucesso do futuro.

Tudo isso torna o trabalho dos profissionais da área de Relações com Investidores mais complexo. Além de altos padrões de transparência e prestação de contas das informações financeiras, precisam ter agora uma abordagem sofisticada que comunique ao mercado como têm atuado em respeito a padrões de desenvolvimento sustentável, comprometimento e contribuição com causas e resolução de problemas sociais. Inclusive, é exigido deles estratégias mais criativas e inovadoras para entregar suas mensagens-chave a um mercado cada vez mais conectado e de atenção cada vez mais difusa.  

É cobrado que esses compromissos estejam no cerne do modelo de negócios da empresa e refletido nos diferentes níveis de sua cadeia produtiva, não estando alocados apenas como uma área desconexa de responsabilidade social, que atue apenas para fins de compensação sem qualquer comprometimento e vínculo duradouro.

Essa é a mensagem que um dos principais fundos de investimento do mundo, a Blackrock, líder global em gerenciamento de investimentos, gerenciamento de risco e serviços de consultoria, tem tentado passar para o mercado – de que as novas regras do jogo combinam retorno financeiro e responsabilidade na administração da dívida, com outros fatores que demonstrem que ela está completamente integrada e consciente do papel que exerce na sociedade. Como Laurence D. Fink, CEO do fundo, tem ressaltado ano após ano nas cartas que divulga ao mercado, “o propósito não é um mero slogan ou campanha de marketing; é a razão fundamental de uma empresa. É o que ela faz todos os dias para gerar valor para as partes interessadas. O propósito não é só a busca pelo lucro, mas a força motriz para conquistá-lo”.


Victor Roland é Executivo de Contas em Public Affairs na Edelman Brasil.